Estudo revela como subsídios para pesca estimulam a sobrepesca no mundo e prejudicam nações em desenvolvimento
Julho 12, 2021
A Oceana publicou um novo relatório com evidências de que as principais potências pesqueiras industriais do mundo estão usando programas que subsidiam a pesca e, assim, transferem o risco de sobrepesca para as águas de outros países. Pela primeira vez, bilhões de dólares em subsídios foram rastreados em todo o mundo e seus destinos incluem as águas dos países menos desenvolvidos.
De um modo geral, esses subsídios são pagamentos que permitem as embarcações viajarem mais longe, ficar mais tempo no mar ou ter maior capacidade do que teriam sem essa ajuda. Eles mascaram os custos da pesca e mantêm embarcações e pescarias com uma aparente lucratividade, mas que na realidade estão sistematicamente em prejuízo pela escassez de pescado.
De acordo com dados de 2018, os mais recentes disponíveis, China, Japão, Coreia, Rússia, EUA, Tailândia, Taiwan, Espanha, Indonésia e Noruega são os 10 maiores fornecedores mundiais de subsídios à pesca, com um valor total acumulado de US$ 15,4 bilhões. A União Europeia, contada como um todo, fornece US$ 2 bilhões, tornando-se o terceiro maior fornecedor, atrás da China (US$ 5,9 bilhões) e do Japão (US$ 2,1 bilhões).
Os “top 10” gastaram US$ 5,4 bilhões em subsídios para pescar em águas de outras 116 nações, e outros US$ 800 milhões em alto mar. No que diz respeito à pesca nas águas remotas de outras nações, a China é o principal doador de subsídios, com um volume de ajuda de US$ 2,9 bilhões, enquanto a maior “pegada” acumulada de subsídios está localizada em águas japonesas, onde estima-se que as frotas de longa distância de outras potências pesqueiras gastaram US$ 1,4 bilhão.
Foto: Oceana
Nas águas de vários países menos desenvolvidos, tanto as capturas quanto os subsídios recebidos pelas frotas estrangeiras excedem em muito os das frotas nacionais. Com apoios financeiros muitas vezes entre 20% e 40% do valor das capturas, é altamente provável que as frotas de longa distância não sejam lucrativas sem subsídios à pesca e acesso irrestrito às águas territoriais de outras nações.
Um caso extremo é o de Guiné-Bissau, onde os subsídios concedidos à pesca estrangeira em suas águas excedem os subsídios domésticos em uma razão de 1.173 para 1.
“A disparidade entre o custo e os benefícios dos subsídios à pesca tem implicações morais e éticas reais. Em média, a fim de obter acesso para suas frotas para águas africanas, as potências de pesca estrangeiras gastam, em dólares, o dobro do que a África oferece em suas próprias pescas domésticas. Para alguns países da África Ocidental, os peixes representam até 60% da proteína em sua dieta”, afirma o coautor do estudo e membro do Conselho da Oceana, Dr. Rashid Sumaila.
É possível, portanto, que os países que mais dão subsídios para suas próprias frotas de pesca terminem por transferir os riscos da sobrepesca para os países que não podem pagá-los.
“A pesca excessiva está esgotando rapidamente estoques pesqueiros em todo o mundo. Segundo a FAO, metade dos estoques vem sendo explorada em níveis excessivos; outros 40% são explorados em sua capacidade máxima, não havendo espaço para aumento de produção em curto prazo. É preciso acabar com os subsídios para a pesca, eles mascaram a realidade da crise econômica da atividade e promovem ainda mais a sobrepesca. É hora de agir para coibir essas práticas”, ressalta o diretor-geral da Oceana no Brasil, o oceanólogo Ademilson Zamboni.
Conferência da OMC
A Organização Mundial do Comércio (OMC) planeja reunir líderes mundiais no próximo dia 15 de julho em uma conferência ministerial para chegar a um acordo sobre regras para reduzir os subsídios à pesca que aumentam a supercapacidade da frota, a pesca excessiva e ilegal, não relatada e não regulamentada (INN ou da sigla em inglês, IUU).
“Milhões de pessoas em comunidades costeiras ao redor do mundo dependem da pesca para seus meios de subsistência e para manter uma boa saúde; e ainda vemos esses mesmos recursos sendo explorados por navios de pesca industriais estrangeiros altamente subsidiados. Depois de 20 anos de atraso, estamos ficando sem tempo e pescando – devemos parar de subsidiar a pesca excessiva imediatamente. Há muito tempo é necessário que a OMC adote regras para eliminar subsídios à pesca; esta é a maior ação específica que podemos tomar para garantir um oceano abundante no futuro”, disse o presidente executivo da Oceana, Andy Sharpless.
Enquanto líderes políticos, ministros e delegados se preparam para a reunião ministerial da OMC marcada para 15 de Julho, a Oceana conclama a OMC para:
- Proibir subsídios à pesca e a todas as atividades de apoio relacionadas que ocorram fora da própria jurisdição de cada estado-membro da organização.
- Apelar aos principais doadores para assumir a maior parte da responsabilidade de eliminar subsídios e redirecionar esses fundos para áreas benéficas.
- Desenvolver um marco para a mitigação de subsídios à pesca que seja transparente, com um prazo claro para ser implementado, orientado em resultados e que tenha regras para reportar dados para todos os estados-membros.