Março 27, 2025
Como sabemos quantos peixes há no mar?
Por: Oceana
O TEMA: Transparência
Em todo o mundo, diversas técnicas, instrumentos, petrechos e tecnologias são utilizadas para pescar. Contudo, muitas vezes, a pesca excessiva gera uma diminuição da quantidade de peixes a níveis insustentáveis: quanto mais se pesca, menos indivíduos conseguem se reproduzir. E, assim, o mar vai ficando com cada vez menos peixe. Mas como sabemos, realmente, quantos peixes existem nos oceanos? É o que responde, nesta edição da série Mar aberto: especialistas respondem, o cientista pesqueiro Daniel Pauly, fundador e diretor do projeto Sea Around Us e membro do Conselho Diretor da Oceana*.
A pesca tem como objetivo retirar peixes do mar. Então, não é de se admirar que a quantidade de peixes esteja menor, considerando tudo o que fazemos para capturá-los. No entanto, não queremos reduzir os peixes no mar a ponto de eles não conseguirem manter suas populações. E isso nos leva a questionar: como sabemos quantos peixes há no mar?
Cientistas pesqueiros respondem a essa pergunta fazendo avaliações de estoque para estimar a biomassa, ou o peso, dos peixes no mar. Essas avaliações podem envolver um amplo leque de métodos, de acordo com os dados disponíveis. Uma das possibilidades é dividir a captura de uma pescaria (o peso dos peixes capturados em um determinado ano) pelo esforço necessário para gerar a captura (o número de horas ou dias de pesca empregados para capturar os peixes naquele ano). O resultado desse cálculo, chamado de captura por unidade de esforço (CPUE), será maior quando o estoque for abundante e menor quando o estoque estiver em depleção [ou redução]. Assim, se houver estimativas de CPUE disponíveis para alguns anos, sua tendência será aproximadamente paralela à tendência da biomassa (ainda desconhecida) de uma população de peixes.
Outra técnica é chamada de método da área varrida, usada para peixes que vivem no fundo do mar ou sobre ele e que possam ser capturados por embarcações de arrasto de fundo. As embarcações usadas para a pesquisa arrastam uma rede de largura conhecida por, digamos, uma hora, a uma velocidade conhecida, para cobrir uma área do fundo do mar que possa ser facilmente calculada. Então, sua captura durante aquela hora pode ser multiplicada pelo número de vezes que essa área cabe em toda a área de pesca, e voilà! Na realidade, analisar os resultados de pesquisas com arrasto de fundo é mais complicado do que isso, mas a ideia básica continua simples.
Outra técnica é o uso do som, como já é empregado para localizar peixes que formam cardumes (como fazem os golfinhos e as baleias), e estimar o tamanho desses cardumes. Ou seja, se emitirmos uma onda sonora de nível de energia conhecido a partir de uma embarcação de pesca, a fração dessa onda que for refletida como eco por um cardume tenderá a ser proporcional ao tamanho desse cardume – portanto, um cardume pequeno refletirá menos som do que um cardume grande. Essa ecossondagem, e os métodos hidroacústicos em geral, podem ser calibrados usando cardumes que foram capturados e pesados, e sua biomassa na água estimada. Esse método funciona melhor com cardumes de peixes pequenos, como arenque, sardinha e anchova.
Outros métodos ainda envolvem tagging, ou marcação, na qual um certo número de indivíduos recebe uma etiqueta ou marca e depois é devolvido ao mar (essas marcas podem variar de uma barbatana cortada a dispositivos eletrônicos que fornecem informações sobre os movimentos e os ambientes que os peixes encontram). As capturas posteriores conterão peixes marcados e não marcados e, por meio de aritmética simples, pode-se calcular o tamanho da população, assim como a taxa de explotação.
Por fim, é possível passar da aritmética simples para a matemática mais complexa e integrar, em uma única análise, modelos computacionais das populações de peixes explotadas, todas as informações da pescaria e outras que estiverem disponíveis sobre captura, esforço, estimativas de biomassa por hidroacústica e dados de marcação.
Essas análises costumam ser acuradas e precisas, mas também podem estar muito erradas. Um bom exemplo disso é o colapso, no início da década de 1990, da pesca de bacalhau na província canadense de Newfoundland e Labrador, que vinha sendo avaliada usando os melhores modelos integrados da época, operados por uma das agências de gestão pesqueira mais respeitadas do mundo. O modelo deles era essencialmente falho porque não interpretava de forma correta as informações espaciais, mas isso não era visível na época devido à complexidade inerente ao modelo. Essa é uma das razões pelas quais, atualmente, a comunidade da conservação marinha insiste na transparência, de modo que os dados e as suposições que entram nas avaliações de estoques de peixes sejam explicitados e justificados publicamente.
Concluindo: seja por meio de análises simples baseadas na captura por unidade de esforço (CPUE), como geralmente é feito em países em desenvolvimento, ou por modelos integrados, como se costuma fazer em países desenvolvidos, a abundância de peixes pode ser estimada para fins de gestão pesqueira, permitindo que os gestores determinem quanto pode ser retirado para que uma pescaria seja sustentada. E devemos insistir para que isso seja feito em todas as pescarias.
*Artigo de Daniel Pauly, originalmente publicado na Oceana Magazine de 2014, e republicado em 2024, na publicação “Pergunte ao Dr. Pauly”: Respostas para a conservação dos oceanos (em tradução livre, disponível em inglês).
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