Assembleia do Fórum Mundial de Povos Pescadores reúne representantes de mais de 40 países em Brasília - Oceana Brasil
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Novembro 27, 2024

Assembleia do Fórum Mundial de Povos Pescadores reúne representantes de mais de 40 países em Brasília

8ª Assembleia Geral do WFFP, realizada em Brasília. Foto: WFFP/Fellipe Abreu

 

Realizado pela primeira vez na América Latina, encontro promoveu diálogos para fortalecer a luta de pescadores e pescadoras artesanais

 

Na semana que antecedeu o Dia Mundial da Pesca (21 de novembro), cerca de 200 pescadores e pescadoras artesanais, coletores e coletoras de águas marinhas, costeiras e interiores dos cinco continentes estiveram reunidos em Brasília para a 8ª Assembleia Geral do Fórum Mundial de Povos Pescadores (World Forum of Fisher People, WFFP). Foram dias e noites repletos de trocas: dos painéis de discussão às místicas, das refeições às assembleias, eles compartilharam suas culturas, experiências e conhecimentos na busca de caminhos para o enfrentamento global dos desafios de suas comunidades.

Mais do que ressaltar diferenças, a Assembleia Geral evidenciou as semelhanças entre os 42 países ali representados. “Os problemas enfrentados no Brasil não são diferentes dos do resto do mundo. Claro que se alteram daqui para lá, mas os povos e as comunidades tradicionais sofrem as consequências de tudo que é feito dentro das águas”, explica a analista de campanhas da Oceana, Miriam Bozzetto. “Termos sido convidados a participar desse evento é um grande ganho, pois nos dá a possibilidade de ouvir e aprender com eles o que podemos fazer pela sustentabilidade da atividade de pesca e pela defesa desses territórios.”

A Assembleia da WFFP tem entre os seus objetivos o empoderamento e o fortalecimento da identidade desses grupos pescadores. “Queremos que, cada vez mais, os pescadores e as pescadoras artesanais sejam olhados como dignos, como merecedores de ter uma casa boa e uma alimentação saudável, presente a partir do nosso trabalho. Porque nós também somos soberanos, sabemos dizer e fazer o que é a soberania alimentar”, reforça Josana Pinto da Costa, coordenadora do Movimento de Pescadores e Pescadoras Artesanais (MPP) e uma das articuladoras do evento pela WFFP.

GÊNERO, JUVENTUDE E PROTEÇÃO AO MEIO AMBIENTE

Nesse olhar identitário, as discussões promovidas pelo evento também alertam para as questões de gênero. Para Josana, esse movimento é fundamental para reforçar os avanços das mulheres, para que a pesca não seja mais vista só como uma atividade masculina, mas de todos que se reconhecem a partir dela.

Representando a Rede de Mulheres da Comissão Nacional de Fortalecimento das Reservas Extrativistas Costeiras e Marinhas (Confrem), Marly Lúcia da Silva Ferreira também destacou a questão das mulheres como um dos pontos comuns no diálogo entre os participantes. “Os relatos são profundos, tristes e muito fortes. Você vê países que a gente imagina como desenvolvidos, com larga escala na indústria de pesca, mas mesmo ali as mulheres ainda são invisibilizadas”, relata.

Outro aspecto importante nos debates da Assembleia da WFFP foi a renovação da atividade pesqueira, a partir da entrada de novas gerações, como foi destacado por Diego Correa Mira, representante da Juventude do MPP. Segundo ele, ainda existe um gargalo que separa os jovens da pesca, tanto no Brasil, quanto mundialmente. “Estamos tentando resgatar nossa juventude, para que ela possa ser inserida não só nos movimentos sociais, mas, principalmente, na base, na atividade pesqueira, que é nossa história, nosso compromisso que precisa ser levado adiante.”

Para o equatoriano Líder Góngora Farias, da C-Condem (Coordinadora Nacional para la Defensa del Ecosistema Manglar), apesar de serem povos e culturas diferentes, todos os povos pescadores estão à frente de um mesmo e principal problema: a destruição do planeta. “Este é um momento muito complicado, com secas para um lado, muita chuva para outro, rios adoecidos, desmatamento, aumento da temperatura do mar… Temos todos esses problemas comuns e estamos buscando dar respostas coletivas, sonhando um caminho que diga: vamos por aqui.”

“Mas não estamos sós. Estamos entrelaçados. Tem outras pessoas vivendo com as mesmas problemáticas que nós em outros territórios. Isso é o mais bonito do intercâmbio de culturas e saberes, isso é o que nos dá forças para seguir”, resume ele, sobre a importância do evento.

RESULTADOS

Assembleia Geral do Fórum Mundial de Povos Pescadores, realizada no Brasil. Foto: WFFP/Fellipe Abreu

Um dos encaminhamentos dos dias de debates intensos na Assembleia foi a declaração oficial do Fórum Mundial endereçada ao G20, que, simultaneamente, realizava sua 19ª reunião de cúpula também no Brasil.  O texto, traduzido em quatro idiomas, é enfático em destacar a devastação ambiental e as mudanças climáticas, assim como o processo de expansão capitalista.

“Esse é um momento histórico, que vai ficar marcado na trajetória do MPP, mas também na de todos que estão aqui. É a partir da unidade dos povos que a gente pode fazer essa declaração ao G20, colocando nosso posicionamento como pescadores, representando a força do Fórum Mundial”, reforça Josana, destacando, ainda, a responsabilidade de realizar a Assembleia no Brasil e, pela primeira vez, na América Latina.

O documento produzido pelo WFFP pede o reconhecimento dos conhecimentos ancestrais e tradicionais, da diversidade dos povos das águas, dos direitos consuetudinários, assim como dos direitos dos povos legalmente estabelecidos nacional e internacionalmente. Também exige, entre outras demandas, o reconhecimento da emergência climática e a responsabilização de Estados nacionais e organizações internacionais que não respeitem seus próprios acordos. Por fim, insta o G20 a deter as guerras e construir caminhos para a paz entre os povos e declara que os povos pescadores são protagonistas de suas vidas e territórios, devendo, portanto, ser consultados e ter autonomia para tomar decisões sobre os mesmos.

A mobilização dos grupos pescadores também culminou na realização do Grito da Pesca Artesanal, que, anualmente, reúne pescadores e pescadoras de todo o país em uma grande marcha em Brasília. Essa 13ª edição teve como tema a luta por justiça climática, soberania alimentar e melhores políticas públicas para a pesca artesanal, e contou também com a participação das delegações internacionais que estavam presentes na Assembleia do WFFP.

*Fotos: WFFP/Fellipe Abreu