Abril 24, 2024
“Um país que pretende ser protagonista ambiental não pode ser um dos maiores produtores de lixo plástico do mundo”
Por: Oceana
O TEMA:
Nesta edição do Oceana Entrevista, o vereador Xexéu Tripoli conta como colocou a cidade de São Paulo à frente na luta contra a poluição plástica
Em seu segundo mandato, o vereador Xexéu Tripoli é um político sintonizado com os desafios dos nossos tempos: é ele o autor de algumas das propostas que colocam a cidade de São Paulo como uma pioneira em repensar o uso e distribuição de plástico descartável no país. Agora, luta para regulamentar a lei do plástico descartável, de sua autoria e que acaba com o fornecimento de itens de uso único (copos, pratos, talheres, agitadores para bebidas e varas para balões) em diversos tipos de locais e eventos na capital paulista. Nessa conversa com a Oceana Entrevista, Tripoli detalha a luta contra essa poluição, que se tornou uma crise global e se mostra em sintonia com a aprovação urgente do Projeto de Lei do Oceano Sem Plástico (PL 2524/2022), atualmente em trâmite no Senado.
As leis “do Canudo” (nº 17.123/2019) e “do Plástico Descartável” (nº 17.261/2020), marcos no enfrentamento da poluição plástica na cidade de São Paulo, são de sua autoria. Quais foram os motivos que o levaram a abraçar esta luta contra a poluição plástica?
Quando tomei consciência da poluição plástica e de suas consequências para o planeta, para a saúde dos animais, incluindo a nossa, abracei essa causa imediatamente. Era meu primeiro ano como legislador, em 2017, e escolhi a problemática do plástico de uso único. Comecei com o Projeto de Lei para banir o fornecimento de canudos plásticos, e muita gente achou que era piada.
A primeira audiência pública desse PL teve presença de peso na mesa, com a participação de representantes do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) e da campanha Mares Limpos, da National Geographic, com aquela capa emblemática da sacola plástica sendo a ponta do iceberg, e de outros setores da sociedade civil, trazendo muita informação sobre o assunto. Foi um pontapé inicial com argumentos fortes para legislar sobre o tema.
Não dá para esquecer de mencionar um reforço muito importante que recebi nessa pauta de combate à poluição plástica: o apoio irrestrito do então prefeito Bruno Covas, um ambientalista nato. Em dois anos, Bruno sancionou três leis de minha autoria: a Lei do Canudo, a Lei do Plástico Descartável e a Lei da Água da Casa. Além disso, assinou o Compromisso Global da Nova Economia do Plástico, até então o maior plano de ação de combate à poluição plástica, uma iniciativa da Fundação Ellen MacArthur e do PNUMA. Esse acordo foi decisivo para o Tratado Global do Plástico que está sendo discutido agora, entre mais de 170 nações.
A Lei Municipal nº 17.261, que proíbe o fornecimento de itens de plástico descartável ou de material oxidegradável (como copos, pratos e talheres), em estabelecimentos comerciais, foi sancionada há mais de quatro anos, e está em vigor desde janeiro de 2021. O que falta para que ela seja regulamentada?
A lei foi sancionada em 2020, com prazo para entrar em vigor um ano depois, tempo necessário para o comércio se adaptar. Houve ainda uma extensão desse prazo, considerando a pandemia, apesar de ficar provado que lavar os utensílios com água e sabão é mais eficiente para combater o vírus, e gera menos impacto ao meio ambiente, do que espalhar material duplamente contaminante por aí. Estamos em 2024 e superamos a pandemia, mas a crise do plástico continua cada vez pior. A poluição plástica já é questão de saúde pública.
No ano passado, houve um grupo de trabalho entre membros da sociedade civil e a Secretaria Municipal do Verde e do Meio Ambiente para definir a minuta de regulamentação da lei 17.261/2020. A Oceana participou dessa construção com contribuições muito valiosas. Já está na hora da lei entrar em vigor. Eu tenho um compromisso assumido pelo executivo de regulamentar a lei até junho deste ano.
Sabemos que repensar o uso de plástico descartável, principalmente com medidas que propõem a redução da produção, distribuição e uso, enfrentam uma séria oposição de setores que têm interesse em manter o sistema como está. O senhor se deparou com alguma resistência dessa natureza?
Já escutei de tudo: que a culpa não é do plástico, e sim do cidadão que joga o plástico no lugar errado. Ou então que são as ONGs que forjam as imagens de animais com plástico no nariz e querem eliminar as sacolas plásticas para vender as suas de algodão. E, pior, que o plástico é 100% reciclável. Sabemos que não é.
Qualquer medida que traz mudanças de comportamento significativas para a sociedade gera conflito com algum setor. Exigir mudanças para indústrias gigantescas não é fácil, mas não tem volta. O Tratado do Plástico da Organização das Nações Unidas (ONU) está tramitando e será global.
O que fará diferença é a consciência de que não dá mais para continuar poluindo o planeta com plástico e seus elementos químicos, que entram na corrente sanguínea, sufocam animais, matam os oceanos. Com essa consciência, vem a coragem para fazer o que é preciso, e não o que é mais fácil.
Líderes têm a responsabilidade de pensar muito além do cargo que ocupam.
Qual a relevância do Projeto de Lei do Oceano Sem Plástico (PL 2524/2022), que propõe a implementação de medidas de Economia Circular para esse material no Brasil? Quais são os obstáculos para nosso país avançar efetivamente rumo às soluções para este problema?
Antes de tudo, parabéns à toda equipe da Oceana pela construção desse projeto federal. Fiz moção de apoio ao PL 2524/2022 na Câmara Municipal e reitero aqui: um país que pretende ser protagonista ambiental não pode ser um dos maiores produtores de lixo plástico do mundo.
Por mais que os municípios façam suas legislações a fim de acelerar a transição para a economia circular e leis que combatam a poluição, é indiscutível a necessidade de legislação federal com os mesmos princípios para dar suporte às leis municipais e estaduais.
Por exemplo, os municípios não podem legislar sobre a venda de um produto. Portanto, o que podemos fazer é proibir o fornecimento gratuito. Somente uma lei federal pode banir para valer o que é inútil e nocivo.
Setores empresariais e industriais ainda insistem que as soluções mais efetivas para a poluição por plástico residem na educação ambiental, na reciclagem e em grandes ações de limpeza dos oceanos e das praias. Como o senhor avalia a efetividade dessas ações?
Todos esses pontos são fundamentais para a transição para a economia circular: educação ambiental, reciclagem e ações de limpeza. Mas o primeiro princípio da economia circular é não gerar resíduos e poluição. Os setores empresariais e industriais muito falam de economia circular, mas cortam justamente esse princípio número 1 de suas narrativas. Defendem o gerenciamento adequado de resíduos plásticos, mas continuam colocando milhões de toneladas de plástico que é inviável reciclar. Portanto, reduzir a produção e o consumo do que for desnecessário é a primeira ação. Tem que fechar a torneira desse plástico contaminante, e isso só acontecerá com leis ambiciosas. Isso sim terá efetividade para todas as outras ações.
Como um dos pioneiros em semear projetos de lei focados na redução da poluição por plástico na maior cidade do Brasil, o senhor acredita que seria possível estender esse movimento a outras casas legislativas municipais e estaduais Brasil afora?
Sem dúvida, a cidade de São Paulo é uma força motriz de novos conceitos para o Brasil inteiro. Vou citar três leis de minha autoria que foram inspiração para leis estaduais: A Lei do Canudo, a Lei do Rojão e a Lei Água da Casa. Veja só a força dos paulistanos. Eu tenho absoluta certeza de que podemos expandir ainda mais. O Brasil possui 5.565 municípios. Meu gabinete está aberto para quem quiser conversar mais sobre todos esses assuntos.
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