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Auditoria da Pesca aponta que ausência de planejamento coloca em risco o futuro da atividade frente às mudanças climáticas

Dados da Oceana revelam que 92% das espécies não possuem planos de gestão e metade das pescarias segue sem monitoramento no Brasil

Agosto 13, 2025

Diante da emergência climática, a pesca brasileira enfrenta o desafio crescente de manter a produção de alimentos e gerar renda para milhões de pessoas. Só em 2024, por exemplo, o governo precisou investir quase R$ 1 bilhão em apenas uma ação voltada para o pagamento de auxílio emergencial extraordinário aos pescadores artesanais da região Norte, em situação de vulnerabilidade em função da grave estiagem. Este valor, 30 vezes maior do que o montante de R$ 32 milhões gasto em ações finalísticas pelo Ministério da Pesca e Aquicultura, demonstra a necessidade de investir em ações de adaptação – e essa é uma realidade para a qual o Brasil não está preparado. Esse é o ponto de partida da Auditoria da Pesca Brasil 2024, lançada nesta quarta-feira, dia 13 de agosto, pela Oceana, em Brasília.

“Do ponto de vista da pesca, o divisor de águas entre os países que vão ser bem-sucedidos e os que vão fracassar está, justamente, nas estratégias de planejamento, monitoramento e ciência para adaptação e contenção de danos”, explica o diretor-geral da Oceana, Ademilson Zamboni. Segundo ele, países como Argentina, Chile, Peru e Estados Unidos já vêm se preparando, com mecanismos de controle rigorosos e planejamentos de longo prazo, incluindo a possibilidade de quebras de safra e escassez de pescados.

A Auditoria da Pesca avalia, pelo 5º ano consecutivo, indicadores de gestão das pescarias costeiro-marinhas no país, como a situação das populações de pescados, o monitoramento, ordenamento e controle das frotas, além do orçamento público e da transparência das informações disponibilizadas sobre pescarias artesanais e industriais. Assim, consolida os dados públicos sobre a atividade, mapeando avanços e retrocessos para propor soluções e prioridades para um desenvolvimento mais sustentável da pesca nacional.

Principais resultados

  • Não existem diagnósticos sobre a situação de quase metade (47%) dos estoques de espécies marinhas e estuarinas que são alvo da pesca comercial;
  • Para os estoques com diagnóstico disponível, 68% já estão muito reduzidos pela pesca excessiva;
  • Não existem planos de gestão para 92% das espécies;
  • 50% das pescarias do país não possuem quaisquer regras de ordenamento. Esse problema é mais comum nas regiões Norte e Nordeste;
  • Apenas 12% das pescarias possuem medidas para reduzir as capturas incidentais de espécies que não são alvo da atividade;
  • Em 2024, 100% dos fóruns de consulta e assessoramento estiveram em funcionamento;
  • O orçamento do Ministério da Pesca e Aquicultura em 2024 foi 85% maior do que em 2023; mas, ainda assim, é o segundo menor do Executivo Federal;
  • Desse total, apenas 3% (R$ 32 milhões) foi destinado para ações finalísticas de pesca, o que inclui, por exemplo, atividades para o desenvolvimento sustentável da pesca e para o registro, monitoramento, pesquisa e estatística.

“Os indicadores tiveram, pontualmente, alguma melhora nos últimos anos e estabilizaram em níveis ainda insuficientes. E não dá para falar em sustentabilidade quando sequer conhecemos a situação das espécies. Um exemplo interessante é o da sardinha-verdadeira.  Sabemos de sua importância econômica, social e, inclusive, nutricional, mas não temos uma avaliação desse estoque e nem um plano de gestão da pescaria, cuja produção é diretamente afetada pelas mudanças climáticas”, explica o diretor-científico da Oceana, Martin Dias.

“Na base de uma boa gestão pesqueira estão sempre os dados e as informações. São eles que fundamentam as decisões, transformando a ciência em regras para guiar o uso equilibrado dos recursos e para combater atividades ilegais. Sem dados, monitoramento, previsão e adaptação, como a pesca e as pescarias brasileiras estarão preparadas para enfrentar um ambiente em acelerada transformação, como o que estamos vivendo?”, questiona.

Foto: Oceana/Bento Viana

Adaptação climática

Se ainda falta muito conhecimento sobre a pesca e os recursos pesqueiros no Brasil, os impactos das alterações do clima, por outro lado, estão cada vez mais explícitos. Conforme aponta a nova edição da Auditoria da Pesca, eles geram prejuízos para a atividade e para os recursos pesqueiros em várias partes do mundo e afetam, diretamente, as comunidades pesqueiras dependentes desses recursos. As alterações da temperatura das águas, por exemplo, influenciam a distribuição das espécies. É o caso da abrótea e da merluza, muito exploradas no Sul e no Sudeste do Brasil, que tendem a migrar para águas mais frias na costa da Argentina e do Uruguai.

Segundo a Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO), a alta nas emissões de gases de efeito estufa e a elevação da temperatura global podem levar a uma queda de 10% da produção pesqueira mundial até 2050, podendo chegar a 30% até o final deste século.

E os eventos extremos, como assistimos com as enchentes no Rio Grande do Sul e com a seca na Amazônia, desencadearão impactos crônicos para a pesca, além de sucessivas crises humanitárias. “Como mulher pescadora, posso dizer o seguinte: nós não estamos vivendo uma previsão, mas uma realidade. A mudança já aconteceu, e já estamos vivendo uma emergência climática”, aponta Josana da Costa, pescadora artesanal do Pará, um dos estados atingidos pela seca histórica no último ano.

“Vários dos problemas que enfrentamos hoje serão endereçados com a aprovação do Projeto de Lei nº 4789/2024, atualmente em discussão no Congresso Nacional. Ele prevê uma modernização da legislação pesqueira atual, com mecanismos que promovem uma pesca verdadeiramente sustentável, que têm sua base na ciência, na participação social e em planos de gestão que contemplem ferramentas concretas para adaptação das pescarias”, defende Zamboni.

5ª edição

A Auditoria da Pesca Brasil é o principal e mais detalhado estudo sobre a gestão pesqueira no país. Publicada pela Oceana desde 2020, ela fornece importantes recomendações para a formulação de políticas públicas voltadas à proteção e ao uso sustentável dos recursos pesqueiros marinhos do Brasil. Em sua 5ª edição, apresenta alguns dos desafios que pescadores e pescadoras, gestores e cientistas já enfrentam em um cenário global de mudanças climáticas, que afetam diretamente a migração, a reprodução e a distribuição das populações de pescados, exigindo mais pesquisas e políticas de adaptação para garantir a sustentabilidade das pescarias.

 

Serviço:

Lançamento da 5ª edição da Auditoria da Pesca Brasil

Assista à transmissão do evento de lançamento da publicação:


Confira a publicação na íntegra e as edições anteriores no site da Oceana.
Acesse também o press kit.

Mais informações:
Déborah Gouthier – dgouthier@oceana.org, (61) 98104-5949
Patrícia Bonilha – pbonilha@oceana.org, (61) 99620-6443

 

A Oceana é a maior organização sem fins lucrativos dedicada exclusivamente à conservação dos oceanos. Com base na ciência, trabalhamos para recuperar a abundância dos oceanos e garantir a saúde da biodiversidade marinha por meio de mudanças nas políticas públicas de países que controlam mais de um quarto da pesca mundial. Nossas campanhas apresentam resultados efetivos, explícitos em mais de 325 vitórias contra a sobrepesca, a destruição de habitats, a poluição por petróleo e plástico e a perda de espécies ameaçadas, como tartarugas, baleias e tubarões. Um oceano saudável pode oferecer uma refeição nutritiva de pescados a 1 bilhão de pessoas todos os dias, para sempre. Juntos, podemos proteger os oceanos e ajudar a alimentar o mundo. Saiba mais em brasil.oceana.org