Nova pesquisa revela que poucas empresas são responsáveis por grande parte dos crimes no mar
Estudo, apoiado pela Oceana, conclui que um terço das atividades ilegais no mar, pode ser atribuído a apenas 20 empresas, segundo banco de dados globais
Março 31, 2022
Pela primeira vez, uma nova pesquisa preparada para a Iniciativa Oceanos Transparentes, da Oceana, usou dados globais para analisar as conexões entre a pesca ilegal e outros crimes cometidos no mar, como trabalho forçado, tráfico de drogas e lavagem de dinheiro, e concluiu que a criminalidade relacionada à pesca é altamente concentrada, e as sanções costumam ser inadequadas.
O estudo, publicado neste mês na revista Science Advances, revela que pelo menos um terço de todas as infrações registradas, das 6.053 listadas no banco de dados, estão associadas a apenas 20 empresas e 450 embarcações de pesca industrial. Cinco dessas infratoras estão entre as dez maiores empresas que pescam em alto mar do mundo, e pelo menos 59% das infrações vêm de embarcações de propriedade chinesa.
A equipe de pesquisadores, liderada pela cientista Dyhia Belhabib, da Ecotrust Canada e da Nautical Crime Investigation Services, analisou o maior banco de dados do mundo sobre delitos relacionados à pesca, concluindo que cerca de metade de todos os incidentes de pesca ilegal envolvem falta de licença (cometidos, em sua maioria, por pescadores artesanais), enquanto cerca de um terço era de outros tipos de violações relacionadas à pesca, como sub-registro de capturas, e 11% envolviam violações trabalhistas e de direitos humanos, quase todas cometidas por pescadores industriais.
“Os pequenos pescadores, que geralmente são mais visíveis para a fiscalização devido à sua proximidade com a costa, são responsabilizados desproporcionalmente por crimes de pesca, enquanto os pescadores industriais costumam ficar impunes”, explica dra. Belhabib. “As punições devem ser proporcionais tanto ao crime quanto ao autor. As multas aplicadas aos pequenos podem ser devastadoras em termos financeiros, considerando-se a sua baixa renda. Tratar adequadamente as infrações do setor industrial ajudará não apenas a reduzir a necessidade que os pescadores artesanais têm de recorrer à pesca ilegal, mas também a combater outros crimes, como a pirataria”.
Os pesquisadores também encontraram 320 ocorrências de pesca ilegal e abuso de direitos humanos entre 2000 e 2020, quase todas a bordo de navios de pesca industrial. De acordo com o estudo, esses crimes geralmente resultam em pequenas multas, e as eventuais penas de prisão são impostas às tripulações, e não aos proprietários das embarcações. Algumas razões para as punições aparentemente brandas podem ser que as agências de fiscalização da pesca não consideram que seja seu trabalho policiar crimes não relacionados à pesca ou o fato de que as leis de imigração e trabalhistas muitas vezes não estão em sintonia, deixando essas vítimas internacionais de abuso de direitos humanos em um grande vácuo jurídico. O estudo recomenda que a fiscalização cubra todo o leque de infrações associadas a embarcações de pesca, e não apenas aquelas situadas no âmbito das agências de pesca do governo. Outros crimes que ocorreram concomitantemente com a pesca ilegal incluíam suborno, uso ilegal ou fraudulento de bandeiras, jogar lixo no mar e transbordo ilegal.
“A pesca ilegal, estimada em cerca de um quarto de toda a atividade, pode destruir habitats marinhos, aumentar a pressão sobre populações de peixes já em risco, ameaçar os meios de subsistência de pescadores que cumprem a lei e prejudicar os esforços de gestão e proteção responsáveis do oceano”, avalia Philip Chou, diretor sênior de política global da Oceana. “Precisamos de regras nacionais e internacionais mais fortes, que acabem com a pesca ilegal em escala industrial e tratem conjuntamente da pesca e dos crimes relacionados”.
A Oceana e os pesquisadores recomendam punições mais duras, como sancionar os proprietários que se beneficiam e colocar na lista “suja” as embarcações dos piores infratores nos registros nacionais, adotando novas políticas que incentivem mais a mudança de comportamento – por exemplo, descriminalizar algumas violações da pesca artesanal em favor de abordagens mais cooperativas, como programas de aquisição (buyback) de equipamentos e sistemas de gestão que gerem mais inclusão das comunidades.
Para acessar um resumo das informações feito pela Oceana, visite oceana.org/fishycrimes. Os relatórios completos estão disponíveis em Nature Human Behaviour e Science Advances. A pesquisa foi encomendada pela Transparent Oceans Initiative (TOI), da Oceana, um programa internacional para revelar os crimes e abusos que são típicos das frotas de pesca em águas distantes, e catalisar mudanças nas políticas para proteger o oceano e as comunidades que dependem dos peixes.