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Setor pesqueiro pede um limite máximo de captura para a lagosta

Dezembro 19, 2019

Anna Salles

Pescadores artesanais recomendaram a adoção de um limite anual máximo de captura para a pesca da lagosta. A demanda foi apresentada nesta quinta-feira (19), em Fortaleza (CE), à Secretaria de Aquicultura e Pesca (SAP) do Ministério da Agricultura. Estavam presentes lideranças de pescadores artesanais dos estados da Bahia, Ceará, Pernambuco e Rio Grande do Norte, fechando assim um ciclo de debates realizados neste semestre, do qual também participaram pescadores de Alagoas, Paraíba e Espírito Santo.

O encontro foi organizado pelos movimentos sociais da pesca e instituições dos pescadores artesanais em parceria com a Oceana e a Secretaria de Pesca e Aquicultura (SAP/MAPA). Participaram ainda representantes da Associação Brasileira das Indústrias de Pescados (Abipesca), do Sindicato das Indústrias de Frio e Pesca do Ceará (Sindifrio), do Instituto Terramar e do Governo do Estado do Ceará.

“Estabelecer o ordenamento da pesca a partir do diálogo com pescadores artesanais é fundamental para que as medidas de gestão sejam adequadas não apenas do ponto de vista ambiental, mas também socioeconômico”, afirmou o diretor científico da Oceana, Martin Dias. “A adoção de um limite de captura para a pesca da lagosta, proposta pelos pescadores artesanais do Nordeste e do Espírito Santo, deverá proteger a espécie e permitir a continuidade da atividade a longo prazo, mantendo as capturas dentro de limites sustentáveis”, acrescentou.

Em linhas gerais, a medida consiste em determinar a quantidade máxima para captura de uma espécie a partir de avaliações de estoque, que levam em conta, sobretudo, a produtividade dos recursos pesqueiros. Com isso, busca-se o equilíbrio entre o que a pesca retira do ambiente e a capacidade natural de regeneração dos estoques. O sistema tem se mostrado eficiente em todo o mundo.

Demanda dos pescadores

O documento entregue reivindica, ainda: (1) a retomada do Comitê Permanente de Gestão da Pesca da Lagosta (CPG-Lagosta), extinto pelo Decreto nº 9.759, de 11 de abril de 2019; (2) a inclusão da pesca artesanal na definição da norma da cota; (3) a criação de uma área de exclusão da pesca para proteger lagosta juvenil; e (4) a proibição de captura e comercialização de lagosta ovada, entre outras.

As propostas são desdobramentos de uma agenda discutida na última reunião do CPG-Lagosta, nos dias 11 e 12 de junho. Na ocasião, os membros deliberaram a realização de um trabalho junto às comunidades pesqueiras para a construção de um plano participativo para a pesca sustentável da lagosta. A Oceana se comprometeu a facilitar esse diálogo. Foram realizados encontros no Ceará, Pernambuco e Rio Grande do Norte. “Ouvimos as demandas dos pescadores artesanais dos diferentes estados e do setor industrial para construir nossas propostas e contribuir com os rumos da pesca da lagosta no Brasil”, destacou a liderança Camila Batista, da Pastoral dos Pescadores do Ceará.

Os resultados também foram comemorados pela Comissão Nacional de Fortalecimento das Reservas Extrativistas e Povos Tradicionais Extrativistas Costeiros e Marinhos (Confrem). “A discussão desse tema tem grande importância porque, além de a gente ouvir pescadores de diversas regiões onde se pesca a lagosta no Brasil, ele traz o sentimento e os anseios do pescador que está na ponta. Vamos continuar com os debates para que a gente siga avançando com o ordenamento da pesca no nosso país”, afirmou o cearense José Alberto, mais conhecido como Beto Pescador, que representou a entidade nos debates.

O sentimento de quem traz a arte de pescar no sangue, atividade passada de geração em geração na família, foi resumida nas palavras de Ivan Laurindo, pescador artesanal que usa o vento como combustível. “Estou nesta luta para que a lagosta seja conservada e a gente possa pescar, porque da maneira que vai a tendência é a lagosta se acabar e, se isso acontecer, acabou a pesca”, disse.

Diante das demandas, a Secretaria de Pesca e Aquicultura (SAP) se comprometeu a considerar as propostas. “Sabemos que a tendência mundial é avançar para os limites de captura e queremos trabalhar nesse sentido, com participação dos pescadores”, garantiu o coordenador-geral de Registro de Aquicultura e Pesca da SAP, Henrique Gonçalves de Almeida. “O CPG-Lagosta foi extinto, mas seguimos trabalhando em fóruns como este, organizado pela Oceana, e a demanda de vocês nos dá pauta para a tomada de decisões”, acrescentou.
De acordo com a SAP, os trâmites administrativos para retomada dos CPGs estão em andamento, mas ainda não é possível precisar um prazo para a recriação.

Produção brasileira

A pesca da lagosta no Nordeste brasileiro é uma das mais importantes fontes de emprego e renda para milhares de famílias que vivem no litoral. Possui caráter artesanal em sua produção, com embarcações de pequeno porte e técnicas de captura com armadilhas.

Embora ocorra desde o Espírito Santo até o Amapá, há uma concentração no Ceará, principal exportador do pescado. O estado foi responsável por 65,1% da exportação de 2019 (janeiro a novembro), de acordo com dados da Secretaria do Comércio Exterior do Ministério da Economia. Em todo o país, a exportação movimentou em 2019 US$ 74,35 milhões, tendo como principais destinos os Estados Unidos (61%), a China (19%) e a Austrália (7,7%).

Estudos apresentados no âmbito do Comitê de Gestão do Uso Sustentável da Lagosta, formado por governo e sociedade civil desde 2004, indicam que a situação dessa pescaria é perigosa, com estoques muito reduzidos e uma baixa capacidade reprodutiva. Cientistas apontam que a qualquer momento pode ocorrer um colapso da pescaria, como recentemente observado em outras pescarias brasileiras como a da sardinha. Medidas de ordenamento pesqueiro, como os limites de captura, são necessárias para recuperar os estoques de lagosta e garantir, no futuro, capturas maiores e com menos risco de colapsar a pescaria.