Setembro 29, 2022
Pescadores e pescadoras artesanais do Sul pedem que lei nacional reflita as regionalidades do país
Por: Oceana
O TEMA:
Em Santa Catarina, lideranças de quatro estados se reúnem mais uma vez para propor novo marco regulatório da pesca
Na 8a Oficina “Construção Coletiva de uma Nova Política Pesqueira Nacional”, realizada em Florianópolis, nos dias 27 e 28 deste mês, cerca de 20 lideranças da pesca artesanal de Santa Catarina, Rio Grande do Sul e Paraná se reuniram pela segunda vez para debater sobre a importância de os saberes tradicionais e as especificidades regionais estarem refletidos num novo marco regulatório para a atividade pesqueira do país.
Nessa 2ª Rodada de oficinas, os trabalhadores e as trabalhadoras da pesca artesanal contribuem para a elaboração de um texto com sugestões de melhorias para a política pesqueira nacional (Lei nº 11.959) vigente, que não é atualizada há mais de uma década. Ela é considerada, pela maioria dos pescadores e das pescadoras, muito distante de suas realidades e sem capacidade de otimizar a cadeia produtiva da pesca no país.
Com seis décadas de ofício, Zequinha, 77 anos, como é carinhosamente conhecido José Frutuoso Goes Filho, segue encantado com a possibilidade de dar opiniões, ouvir e respeitar os relatos dos companheiros e das companheiras.
“Esse projeto deveria ter acontecido há tempos. Mas nunca houve essa oportunidade. Agora, graças à Oceana, estamos aqui juntos para construírmos uma lei da pesca efetiva, trocando ideias com amigos e amigas de vários estados, cada um com sua modalidade de pesca”, avalia o pescador. Representante da Colônia Z-11 e da Federação de Pesca de Santa Catarina, ele começou a pescar com 14 anos.
Foi com atenção e curiosidade que Zequinha ouviu o relato do jovem pescador Maurício Agostinho Dias, 28 anos, da Ilha do Mel (PR), que contou sobre as dificuldades enfrentadas no litoral paranaense. “Precisamos de informação e conhecimento para enfrentar a especulação imobiliária. Por estarmos em um bioma protegido, hoje, temos protocolos de consulta. Foi uma vitória. Nós, pescadores e pescadoras, precisamos ser ouvidos. É muito importante que esse documento abarque a realidade de cada estado para ser uma proposta nacional”, destaca Maurício, que integra o Território Nativo e representa o Movimento de Pescadores Artesanais do Litoral do Paraná (Mopear).
“Quando finalizarmos as dez oficinas, vamos ter em mãos um documento plural e de muitas vozes, que refletirá a pesca de Norte a Sul do país. Esse material vai ser uma bússola para a reconstrução de uma política nacional pesqueira que otimize e proteja essa atividade”, considera Martin Dias, diretor científico da Oceana.
Entre essas vozes, está a forte presença feminina que marcou os dois ciclos de oficinas. Liderança do Conselho Pastoral dos Pescadores (CPP), Valmira João Gonçalves, conhecida como Kaká, é filha e irmã de pescadores, mas nunca pescou. Entrou na militância por melhorias no ofício quando percebeu que se tornou uma exceção à regra.
“Como fui criada por outra família, pude estudar. Infelizmente, não há políticas públicas para que as famílias de pescadores consigam colocar seus filhos e filhas nas escolas”, revela Kaká, que exalta a presença feminina da mulher pescadora na cadeia produtiva da pesca brasileira.
Acompanhando de perto as oficinas da Oceana, a analista de campanha Míriam Bozzetto tem testemunhado essa emancipação da mulher, pescadora, marisqueira, assumindo cargos de liderança e trazendo demandas específicas para que o futuro marco regulatório da pesca possa espelhar esse recorte de gênero. “Esse documento que é fruto dos saberes dos pescadores e das pescadoras do Brasil vai trazer a importância de redimensionar o papel da mulher na pesca. Precisamos de uma política nacional que reflita a sua importância nas organizações da pesca, nas famílias e na sociedade”, conclui.
Próximo encontro
Nos dias 4 e 5 de outubro, o segundo ciclo de Oficinas aporta em Belém (PA) para dar prosseguimento à construção coletiva do documento que busca garantir uma pesca eficiente, sustentável, representativa e inclusiva para as atuais e futuras gerações.
Em breve, a Oceana também promoverá discussões junto a pesquisadores, organizações não governamentais, representantes da pesca industrial e sociedade civil, para garantir que todo o setor participe desse processo, contemplando transparência, conhecimento técnico, saberes tradicionais e participação social.
Fotos: Acervo Oceana
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